Confira o texto desta semana do escritor Paulo Curió!

 

Sou de uma família de 5 irmãos, meus pais sofriam pra tentar manter a paz dentro de casa. Minha mãe sempre utilizou a seguinte frase – Você gostaria que fizessem com você o que você acaba de fazer com seu irmão? – era a lição de empatia.

Vivemos um período de muita discussão sobre sexualidade, gênero, família tradicional, bons costumes. Resolvi então ser empático e me questionar – E se eu fosse gay? – não me perguntei como seria se tivesse nascido gay, mas se me descobrisse gay hoje, aos 36 anos e pai de dois filhos.

Sou engenheiro mecânico de formação, trabalhando na indústria e como professor, acredito que não esqueceria nada do que aprendi, muito menos influenciaria no meu desempenho como profissional. Afinal, meu conhecimento técnico se fez em ambientes de ensinos e não numa cama.

Sou professor de dança, um forrozeiro doente há mais de 20 anos. Já fui capoeirista por quase duas décadas, ginasta, trabalhei na musculação e muitas outras áreas, minhas habilidades físicas e motoras não desapareceriam junto com minha heterossexualidade.

Sou escritor, leio bem menos do que gostaria e deveria, busco minhas referências em filmes, séries, músicas, poesias, nas histórias de vida das pessoas, na minha observação do mundo. Meus medos, minhas qualidades e defeitos, meus sonhos, minha perspectiva, nada disso seria alterado. Concordo que algumas delas, agora sim, são feitas na cama. Mas sexo é sexo e amor é amor. O resto é incapacidade de interpretação.

Sou ateu, mas vamos imaginar que acreditasse em um criador. Já que estamos numa situação hipotética sobre minha sexualidade, podemos fazer isso também sobre minhas crenças. Trabalho para ser uma pessoa boa, não perfeita, mas melhor a cada dia, uma constante evolução, acredito ter um pouco de sucesso nisso. Se todo esse caminho evolutivo for desprezado por minha orientação sexual, sendo demonizado, prefiro não passar a eternidade no céu.

Sou filho, confesso que já dei trabalho, mas nada demais. Respeito meus pais, mantenho-me presente, somos unidos a nossa maneira. Sempre os ouvi dizendo em alto e bom som – Se um dia você for preso, jamais espere que vá me humilhar pra te ver na cadeia, por mim você apodrece lá – mas nunca, nunca mesmo, opinaram sobre a sexualidade de nenhum dos filhos. Não fomos criados machos e fêmeas, nos fizeram humanos, nos fizeram com amor.

Meus verdadeiros amigos, os raros, foram escolhidos a dedo. Amizades forjadas pela admiração mútua, respeito. Nunca julgaram meus relacionamentos ou as pessoas com quem me relacionei. Puxaram minha orelha, me aconselharam, me abraçaram, mas nunca interviram. Pra eles, não seria problema.

Aos que me conhece bem, sabem da importância da paternidade na minha vida, como meus filhos são parte imensa de mim e, por incrível que pareça, acredito que seria a parte mais fácil, de menor julgamento. As pessoas dizem – Como explicar pro meu filho que fulano tem dois pais – você já tentou explicar o que é sexo, como as crianças são feitas, pro seu filho? É a mesma coisa! Meus filhos não presenciam cenas de beijos ardentes ou carícias entre minha companheira e eu. Nunca me viram fazendo sexo. O que presenciam é o cuidado, o afeto e as pequenas demostrações de amor. Zelo e Ternura. Pessoas se amam e isso é lindo. Nunca me preocupei com as preferências sexuais dos meus pais, o que fazem ou deixam de fazer na cama. Se você se apega a isso, procure um tratamento já, só acho.

Então você dirá que existe uma grande exposição nas mídias, cenas de sexo, beijos, relações homossexuais. Concordo, em partes, algumas são deselegantes, abusivas, tanto quanto as cenas heterossexuais. Alguma vez, seja num restaurante, na beira da praia, sei lá, já presenciou, juntamente com seus filhos, um casal hétero se agarrando como dois animais no cio? Chato, né!?

Resumindo, se eu fosse gay seria “problema” sexual meu!

 

Paulo Curió*

 Sobre o Autor

Nascido em Porto Alegre, Paulo Curió, mudou-se para Lavras no início de sua adolescência, em 96. Amante da cultura popular, capoeirista desde os 5 anos de idade, desenvolveu projetos de capoeira por mais de uma década. Foi em Lavras, ainda nos anos 90, que seu trabalho como professor de dança ganhou notoriedade, sendo convidado a ministrar aulas em diversos locais. No início dos anos 2000, resolveu estudar as artes cênicas, indo para as cidades do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte. Desenvolveu projetos de destaque no âmbito cultural na cidade como Coordenador do Núcleo Cultural Unilavras. Metalúrgico desde 2005, graduou-se como engenheiro mecânico, tornando-se professor dos cursos de engenharia civil e produção. Atualmente, leciona em cursos de pós-graduação pelo Grupo UNIS, sendo engenheiro e responsável técnico da Mercomolas Indùstria de Molas,  consultor na Onixx Consultoria Organizacional. Curió, também, é músico na banda Circo da Lua e professor de forró. Como escritor, lançou em 2017 sua primeira obra, intitulada “Hemisférios – dos amores racionais às razões do amor”, um livro de contos, crônicas e poesias.

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