Por Diego Nascimento: A cantineira e o menino machucado

 

 

TÚNEL DO TEMPO

A cantineira e o menino machucado

Por Diego Nascimento*

Era uma manhã de sol na Escola Estadual Álvaro Botelho (hoje uma instituição municipal) na cidade de Lavras, Minas Gerais. O sinal para o intervalo havia tocado e eu, com os meus 9 anos de idade, saí em disparada rumo ao pátio para ser um dos primeiros da fila da merenda. Mas o que seria mais um momento de alegria na vida de uma criança se tornaria, em questão de segundos, uma tragédia. O sorriso foi substitúido por um choro profundo e amargo com direito a plateia.

Enquanto eu descia as escadas, percebi que subiria ao pódio da cantina. Por esta razão, dei um salto para adiantar o percurso e acabei sendo traído pelos meus pés; o que alcançou o chão foi o meu joelho direito.  Em milésimos de segundo um grito de dor dominou cada metro quadrado da escola e meus colegas assustados foram atrás de ajuda. Fui conduzido para o pátio sob o olhar atento dos curiosos. De repente, quando parecia não haver mais esperanças para o cessar de minhas lágrimas, ouvi uma voz calma e doce.  Aquela seria uma das maiores manifestações de cuidado que receberia durante a vida estudantil.

Uma das cantineiras veio ao meu encontro carregando uma espécie de massa que, mais tarde, descobri ser limão e sal. De forma serena, ela massageou o meu joelho machucado e tentou acalmar o meu desespero por meio de palavras de conforto. Confesso que foi um momento único e, por incrível que pareça, a dor passou e a tristeza pelo acidente de percurso também se dissipara.

Os anos seguintes foram marcados com muita intensidade em meus estudos e início da jornada profissional. De forma direta, a atenção que aquela senhora teve comigo trouxe influências positivas para a minha formação como pessoa e nas atitudes de cuidado com o próximo. Mas ainda faltava algo: contar à cantineira como ela mudou o meu dia no que seria mais um corriqueiro momento de 1993.

Ao conversar com funcionários do Álvaro Botelho, fui informado de que os profissionais daquela época já estavam aposentados. Muita coisa havia mudado depois de quase vinte e cinco anos. O que eu não sabia é que os meses seguintes trariam uma grande surpresa. Certo sábado, decidi por resolver algumas coisas no centro da cidade. Estacionei meu carro e segui parte do trecho caminhando. Ao atravessar a rua tive uma visão supreendente: em pé, no ponto de ônibus do outro lado da calçada, estava ela: a cantineira. Como o tempo não oferece trégua, as marcas da idade eram visíveis na face daquela senhora que ainda sustentava o mesmo sorriso e o olhar de afeto.

Por fim, eu creio que você já deve imaginar o que aconteceu. Cheguei perto e, com toda a mansidão possível, saudei com um gentil “Bom dia”. Ela respondeu positivamente e eu segui falando: “A senhora talvez não se lembre de mim ou do fato, mas acontece que vinte e cinco anos atrás um aluno sofreu um pequeno acidente no pátio da escola. Em meio ao desespero, você cuidou daquele menino e acalmou o coração dele. Serviu de grande exemplo. O que quero dizer é que o estudante machucado era eu. Ao reconhecê-la aqui na rua, tantos anos depois, quis dizer algo que guardo há mais de duas décadas: MUITO OBRIGADO!”

PS.: jamais deixe para amanhã o agradencimento que pode ser feito agora.

Diego Nascimento é jornalista corporativo. Atualmente é líder do Escritório de Projetos da Pemi Construtora /Construtora Lasper com atividades em Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Goiás. Também atua como tradutor consecutivo e palestrante nacional e internacional. 

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