Escritor Paulo Curió fala sobre amor na crônica de hoje – Confira!

AMOR METAESTÁVEL

Depois de afirmar que a astrologia é uma pseudociência, o terraplanismo socialmente aceito, digo que sou sagitariano – isso pra mim é irrelevante, mas as pessoas acham importante saber – parece que por ironia dos astros nasci aventureiro, tarado e desprendido. Confesso, fizeram meu mapa astral e algumas coisas fazem sentido – todo charlatanismo faz.

Me aproximo, de uma maneira mais veloz do que gostaria, dos 40 – isso me impressiona, afinal, em muitas coisas ainda me sinto, e me comporto, como um adolescente – sentimental incorrigível, busco sempre respostas. A dúvida do momento é a coexistência do amor e da paixão. Tratados, quase sempre, como matéria e antimatéria, senti-los simultaneamente, pra mim, é questão de sobrevivência.

Ouvi de uma amiga – homens são caçadores de presas vivas – depois da conquista, perdem o interesse e farejam uma nova vítima. Vejo esse comportamento comum também nas mulheres. Quando não são despertos o amor e a paixão, é normal não haver nenhum envolvimento posterior. Na era de amor “Bauman”, aponta-se o dedo para o próximo contatinho e a fila anda.

Sabe-se que nosso cérebro evoluiu para encontrar lógica nas coisas, estamos sempre em busca de padrões, simetrias, formas conhecidas, nada podemos fazer em relação a isso. Gostamos de ordem – ingenuidade pura, é no caos que a vida nasce e evolui, mas isso é assunto para outro texto – É quase unânime: paixão primeiro, amor depois. Costumam dizer que amor é o que fica depois da passagem do furacão da paixão. É como se a paixão tivesse prazo de validade e o amor fosse imortal – mesmo de Vinicius de Moraes ter trazido uma nova definição de eternidade no amor no Soneto da Fidelidade – Revi minha vida, e acho que fugi a essa regra – sou sagitariano, né?!

Já tive relacionamentos em que já era amor antes mesmo do beijo, como descrito por Fernando Pessoa – “Quando te vi amei-te já muito antes. Tornei a achar-te quando te encontrei. Nasci pra ti antes de haver o mundo” – havia tanta segurança, reciprocidade, certeza, que a loucura da paixão não encontrou espaço. Acredito muito no poder das sintonias, existem conexões inexplicáveis, e existem explicações que são desnecessárias. Quando isso acontece não há medo, nem desespero, é apenas carinho e cumplicidade.  Encontrar alguém pra dividir a vida é fantástico. Pena que um sagitariano com ascendente em Áries e Vênus em Aquário, não consiga viver sem um friozinho na barriga – digo isso apenas para me isentar de qualquer erro, como podem perceber, a culpa é das estrelas.

Se paixão é passageira, fiz viagens longas. Vivi histórias onde a paixão nunca passou. Acho que todo mundo já viveu isso. Não há estabilidade, é sempre guerra e sexo. Um luta diária pela garantia do amanhã. Nesta fase somos amplificadores, qualquer palavra singela torna-se uma magnifica declaração de amor, em contra partida, qualquer palavra ríspida, vira uma ofensa imperdoável. Transitamos entre extremos. Nossa rotina é consumida pela relação, não sobra tempo pra mais nada. Tá, falando assim parece que a paixão é apenas desgaste, mas quando se está num relacionamento estável, ansiamos viver essa loucura novamente. Ainda bem que nunca estamos satisfeitos, a vida perderia o sentido.

Nas ligações químicas a maneira em que as moléculas se arranjam definirá a estrutura do material, além das suas propriedades físicas, as ligações afetivas fazem o mesmo. É preciso descobrir o quê, quando e como aconteceu a ligação com o outro. Quem desconhece a estrutura da relação, jamais saberá o que ela é de verdade. Somos ligados por intelecto, crenças, objetivos de vida, sexo e, um novo fenômeno observado, pela política. É bom lembrar que existem ligações fortes e ligações extremamente fraca, como pontes de Van der Waals.

E, se o amor for sólido, mas metaestável? Se a estabilidade amorosa, tão desejada em alguns momentos da vida, ao menor sinal de perturbação do equilíbrio, der espaço, repentinamente, para o cenário caótico da paixão. Isso poderia resolver o problema da coexistência, e mais, agradaria gregos e troianos. As ligações não deixariam de existir, apenas se reinventariam dentro da estrutura. Ainda seríamos nós, mas diferentes. A vida é muito curta. Ser muitos em apenas um numa mesma encarnação me parece tentador.

O colapso de uma relação é como a morte de uma estrela. Quando nos distanciamos demais enxergamos apenas um brilho intenso, uma projeção luminosa daquilo que fomos um dia. A morte do amor deu-se ano-luz no passado, não conseguimos perceber. Os gestos de carinho ainda estão ali. A mão estendida está sempre ali. O companheirismo. O amor não, muito menos a paixão, responsável pelo efeito estufa, aquele que mantém tudo em sua temperatura ideal, dando condições para o surgimento da vida, tornando-nos planetas habitáveis. Caos e excitação, tudo de melhor que a vida pode oferecer.

Para esse sagitariano, seja lá o que isso significa, o amor deve ser metaestável!

 

Paulo Curió

 

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