Os 40 anos de um clássico de Kubrick

Grande foi o desconcerto quando o cineasta Stanley Kubrick (1928-1999), após duas incursões futuristas – em 2001, Uma Odisseia no Espaço e A Laranja Mecânica -, deu marcha a ré no tempo e adaptou o romance de William Makepeace Thackeray sobre as memórias de Barry Lyndon.

No próximo dia 18 de dezembro, Barry Lyndon completa 40 anos. O filme foi indicado para algumas categorias do Oscar e venceu em quatro – fotografia, música, direção de arte e figurinos -, mas nunca desfrutou da fama nem popularidade de outros grandes filmes do autor. Os franceses o amaram, enquanto os americanos o detestaram. Coisas da vida.

Dotado de um censo estético e perfeccionista que lhe foi tão caro, Kubrick mostra um século XVIII corrupto e sombrio sob o olhar do malandro Barry Lyndon, interpretado magistralmente por Ryan O’Neal, uma espécie de alpinista social que acaba por se esfacelar diante das circunstancias da vida. O filme tem de quebra a beleza ofuscante da atriz Marisa Berenson, que interpreta a esposa do protagonista, Lady Honoria Lyndon.

Para reconstruir toda a atmosfera daquele período, o diretor optou por filmar exclusivamente à luz natural, ou à luz de velas, cada cena. A façanha foi conseguida graças à Nasa, que desenvolveu uma lente especial que fora utilizada pelo fotógrafo John Alcott, e que o diretor americano manejou com a maestria de um grande pintor daquele período histórico. A cada plano uma surpresa, uma contemplação provocadora.

Poucos filmes desvendaram tão profundamente a alma humana quanto Barry Lyndon. Aqui importa menos as bandeiras políticas esgarçadas por qualquer ideologia, e mais o sentido moral que dá a cada personagem. A queda da aristocracia é apenas um pretexto para o velho Kubrick xeretar a alma humana. Os planos longos das cenas parecem ser meditações profundas sobre a consciência de cada personagem.

Nesse nosso tempo sombrio impregnado de ruinas ideológicas e multidões ruidosas a procura de um sentido para suas vidas, rever Barry Lyndon torna-se um ato não só de coragem, mas um reencontro com nossa liberdade interior diante à frieza de uma era chafurdada pelo politicamente correto e o lugar comum.

Marco Aurélio Bissoli

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