Manuel, o sobrevivente

Era um dia muito bonito, em que as folhas secas despencavam aos borbotões das árvores da praça sobre o chão, deixando rastro de coisas mortas por todos os lados, num incrível festival de outono. Sementes caiam no chão, batendo nos carros e arranhando a pintura dos mesmos.
Estávamos sentados, num banco de concreto, debaixo do caramanchão, esperando o tempo passar, ou folheando revistas na banca do Gê, ou tomando cerveja no bar do enjoadinho.
Havia um cheiro podre no ar, com soldados passando, com seu uniforme cáqui, puídos, fuzis muito antigos, baionetas enferrujadas e um ar de preguiça, a todo tempo.
Quem sou eu, pensava, fazendo hora para arriscar uma fugida ao Hotel Pinguim, na rua da Zona Boêmia.
Fazia barba, em casa, enquanto o pai se refastelava numa cadeira do Salão do Jacques, no centro da cidade, ao lado da casa de Ramonzito.
– Esta merda de golpe – Vai durar pouco dizia o funcionário público, Fernando Chaves, apaixonado pela Nadir.
Coitado! Se enganou! Aquela revolução fajuta acabou durando mais tempo do que esperado, e gente protestava nas ruas de Beagá.
Margarida Luzia de Matos era minha “namolada” de passeata, enquanto Dilma, muito inteligente e preparada ideologicamente, optava pela luta armada.
Se um dia meu coração for procurado, para saber se andou errado, saibam que sim, pois eu tinha tristeza daquele tal de AI-5, e me escornava nos bairros ao lado da turma do Cinema Novo.
Ai! Ai! Eu queria mais era vadiar nas ruas, ou sair com a Debinha, para assistir  o “Candelabro Italiano”, no Cine Brasil, a luz da lua, projetado pelos Parrágas…
– Otto é um viado! – arengava Antônio  Massahud, de boticão na mão, atrás de um dente arrebentado…
No final, Reginaldo e eu, entoávamos o Hino Nacional Brasileiro…
Porque o Mundo dava voltas, e eu, Manuel, era um sobrevivente, daqueles tempos…
Adriano continuava a paquerar as garotas de qualquer tipo e tamanho, no Bar do Vô Vico…

De perna avariada, fui…

 

Compartilhe esta notícia:

Facebook
Twitter
LinkedIn
Pinterest
Últimas Notícias