Mais da metade dos detentos de Minas Gerais não concluíram ensino fundamental

Mais da metade dos detentos que ingressam no sistema prisional de Minas Gerais não concluíram sequer o ensino fundamental. Segundo o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), com dados de dezembro de 2014, o índice (54,3%) está acima do nível nacional, que é de 49,5% de detentos que não chegaram ao ensino médio. A situação mais grave é de Alagoas, com 21% de analfabetos, enquanto em Minas esse número é de 2,89%.

Um dos detentos que chegaram ao sistema prisional do estado sem nem sequer completar o fundamental foi Humberto Hajime Alvarenga, de 45 anos, preso em 2007, condenado a 34 anos de prisão por homicídio. Transferido da Penitenciária Nelson Hungria para a José Maria Alkimim, em Ribeirão das Neves, em 2009, ele concluiu o fundamental e o médio por meio de supletivo e notas no Enem. Hoje, cursa o sexto período de administração e o terceiro de engenharia civil, por meio de ensino a distância (EAD). “Larguei o estudo muito cedo, porque já havia repetido várias vezes de ano e fui trabalhar. Depois não me preocupei. Só depois que vim pra cá é que vi como é importante ter estudo. Desde que ingressei aqui, comecei a ler e fui vendo as oportunidades”, contou Humberto à reportagem, por telefone, no setor de trabalho e produção da unidade profissional, escoltado por agentes penitenciários.

A população carcerária de Minas é de 69.262 presos, mas a oferta de vagas de ensino abrange apenas 11% deste universo. São cerca de 8 mil pessoas privadas de liberdade, que estudam no interior de 119 unidades prisionais, embora a demanda – como mostram os números do Infopen – sejam bem maiores. Além deles, 271 estudam em 22 instituições de ensino superior em diversos cursos.

Desde 2011, é realizado o Enem Prisional, que no ano passado teve o número recorde de participantes: 9.541 inscritos, realizado em 135 unidades prisionais do estado. O Enem serve para tirar o certificado de ensino médio – 78% dos inscritos em todo Brasil se inscreveram no ano passado com essa finalidade –, e para ingressar na universidade. Pesquisas e especialistas comprovam que o índice de reincidência no crime é menor por parte de quem se ocupa durante o período de reclusão. “A disparidade é muito grande, de quem se ocupa ou fica ocioso aqui dentro. O estudo me ajudou a ressocializar, ler e ver coisas novas”, garante Humberto.

REINSERÇÃO Para a psicóloga Vanessa Barros, do Observatório Nacional do Sistema Prisional, a escola dentro do sistema prisional deve se preocupar não só para a obtenção do grau de escolaridade, mas oferecer possibilidades de reinserção. “A escola dentro do sistema prisional é de suma importância, mas ela precisa oferecer aos presos alguma possibilidade diferente, com oficinas, medidas profissionalizantes”, afirma a psicóloga.

Para Humberto, o principal desafio será justamente quando sair da José Maria Alkimim – com diploma de graduação ou não. “Estou ciente das dificuldades. Se está difícil para quem está aí fora, meu trabalho será dobrado por causa da discriminação. Mas estou animado para ter outra vida”, garante.

“Mentalidade encarceradora”

Minas Gerais tem hoje mais de dois presos para cada vaga disponível. A população carcerária do estado é de 69.262, sendo 60.776 presos em unidades da Secretaria de Estado de Administração Prisional (Seap). Atualmente, a capacidade é de 32.758 vagas. Para 2017, o governo vai inaugurar quatro unidades prisionais, o que resultará na criação de mais 1.120 vagas. Nas unidades administradas pela Seap, o custo médio de cada preso é acima da média nacional divulgada recentemente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Caso seja agrupada a manutenção do detento no sistema – com comida, estudo, trabalho, itens de higiene, água, pagamento do agente penitenciário, mais a construção da unidade –, o custo mensal fica em torno de R$ 2,7 mil, variando segundo a lotação da unidade.

Para o desembargador Alexandre Carvalho, da 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), o Brasil enfrenta hoje um problema semelhante ao de países como Estados Unidos, Rússia e Índia: uma mentalidade encarceradora. “Cerca de 40% dos nossos presos são provisórios, sem condenação definitiva. Isso expressa bem nossa mentalidade encarceradora absurda. A população tem o sentimento de que está segura quando se prende, mas estamos, muitas vezes, entregando um ladrão que agiu em momento de desespero de bandeja para o crime organizado. É algo que o Judiciário está refletindo”, afirma.

“Os EUA já estão percebendo o alto custo dessa mentalidade e procurando soluções com dignidade humana, porque é caríssimo para o Estado manter tantas pessoas atrás das grades”, afirma o desembargador. Para Alexandre Carvalho, uma das soluções é aliar educação e profissionalização. “Políticas públicas eficientes são fundamentais não para resolver, mas minorar o problema da segurança pública. (RD).

Fonte: Portal Uai

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